Livro conta como a música salvou dezenas de mulheres da morte em Auschwitz 

“A Orquestra Feminina de Auschwitz – Uma história de sobrevivência” foi publicado no Reino Unido. Edição em português vai sair em abril pela Editora Planeta.

Março 31, 2025

Ao pedir para tocar violino antes de ser submetida a uma experiência científica no campo de exterminação de Auschwitz, Alma Rosé escapou não só a uma morte quase certa como salvou dezenas de outras mulheres. 

Esta é uma convicção da escritora britânica Anne Sebba, autora do livro “A Orquestra Feminina de Auschwitz – Uma história de sobrevivência”, publicado no Reino Unido e cuja edição em português vai sair em abril pela Editora Planeta. 

“Ela não se considerava judia, mas decidiu salvar o maior número possível de judeus”, contou Sebba durante a apresentação do livro a um grupo de jornalistas em Londres, incluindo a agência Lusa.

A violinista profissional judia austríaca, sobrinha do compositor Gustav Mahler e membro de uma família com tradição na música, chegou ao campo de Auschwitz em 1943 e foi inicialmente selecionada para uma “pseudo-experiência científica” sobre esterilização feminina.

Como último desejo, Alma Rosé pediu para tocar violino. 

O seu talento foi imediatamente reconhecido e foi transferida para Auschwitz-Birkenau, para dirigir a orquestra feminina até então comandada por Zofia Czajkowska, uma antiga professora polaca que tinha convencido os guardas de que era parente do compositor Tchaikovsky – o que não era verdade. 

Entre meados de 1943 até abril de 1944, quando morreu subitamente aos 37 anos, alegadamente de intoxicação alimentar, Alma Rosé dirigiu com mão de ferro a orquestra, a única feminina entre múltiplos conjuntos masculinos.   

Graças a ela, o grupo de cerca de 40 mulheres de várias nacionalidades, desde francesas, belgas, polacas ou gregas, foi poupado do trabalho manual e beneficiava de condições mais favoráveis em relação às outras prisioneiras. 

O seu trabalho era tocar de madrugada e fazer com que as outras cativas marchassem mais depressa para o trabalho e voltassem no fim do dia, sempre em filas de cinco, tornando-as assim mais fáceis de contar. 

Noutras ocasiões, tocavam junto à plataforma do comboio para acalmar os recém-chegados ou entretinham os oficiais alemães. 

A escritora britânica está convencida de que Rosé sabia que a orquestra “era uma tábua de salvação” e “dizia frequentemente: ou tocamos bem, ou seremos mortos”. 

“Ela era uma disciplinadora muito firme. Provavelmente, de vez em quando, atirava a batuta e punia os músicos se tocassem um fá sustenido e não um fá natural e obrigava-as a esfregar o bloco durante uma semana”, reconheceu Anne Sebba. 

Isso implicava ensaiar durante muitas horas consecutivas, com pouca comida e num pavilhão frio, apesar de terem um estatuto beneficiado, pois viviam num espaço separado, tinham uma cama própria, cobertor e roupa interior e não tinham de fazer trabalho manual. 

“Não creio que a comida fosse muito diferente, e elas trabalhavam sem parar, mas o maior privilégio que ela [Alma Rosé] lhes deu foi a esperança, a esperança de que pudessem sobreviver”, vincou Sebba.

A maestrina foi a única que não sobreviveu entre cerca de 40 mulheres que formaram aquela orquestra, algumas das quais viveram até aos 100 anos.

Várias seguiram carreiras artísticas, outras ficaram traumatizadas. 

A violinista belga Hélène Wiernik, uma das mais talentosas do grupo, não voltou a tocar depois de deixar Auschwitz, onde o irmão de 11 anos morreu nas câmaras de gás. 

A autora britânica entrevistou duas sobreviventes, Hilde Grünbaum (1923-2024), entretanto falecida, e Anita Lasker-Wallfisch, atualmente com 99 anos, esta última a residir em Londres.  

Outra sobrevivente, Esther Loewy (1924-2021), que após casar-se passou a usar o apelido Bejarano, chegou a visitar Portugal um ano antes da morte, a convite da Escola Alemã de Lisboa.

Para Anne Sebba, “elas são todas heroínas” porque escaparam aos maus tratos e tentativa de exterminação dos nazis graças não só aos talentos musicais, mas também ao instinto de sobrevivência e ao espírito de equipa, “sem nunca perderem a bússola moral”. 

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